terça-feira, outubro 28, 2003

Dela
O problema com os e-mails dela é que insistem em não querer sair da minha caixa. O problema dos e-mails é que eles lotam a minha gratuita caixa. O problema da gratuita caixa é óbvio.

Dele
Gosto mais nem de falar não. Porque não sei mais como me sentir. Eu só sei que tem um sei lá o quê que não vem nem vai embora.

segunda-feira, outubro 27, 2003

Acontece que deu certo. Pra mim deu. E ninguém vai entender, que eu sei, acho. Um pouco feliz.

segunda-feira, outubro 20, 2003

Há duas semanas atrás...

- Alô, Mirellinha, minha filha é a Madrinha...

Ela tinha perguntado na agência que contratou se não havia alguma vaga lá para alguém. Disseram que tinha.

- Pois eu vou passar pra ele, viu? O nome do rapaz é Denis.
- Certo.
- Oi, Mirella?
- Oi, Denis?
- Oi Mirella, é... a sua madrinha já explicou né? Agora é bom a gente marcar uma hora, você me pepara um currículo e a gente conversa.
- Certo.
- Que horas eu posso te ligar?
- Que horas você pode me ligar?
- É que eu vou viajar, pode ser hoje à noite?
- Pode. Agora me diz um intervalo de tempo para eu não sair de casa.
- Pois então te ligo às 7 em ponto.
- Certo.


às 6:

- Bia vai ligar uma pessoa pra mim, por favor não vai pra casa agora, me espera chegar. Ele vai ligar às 7. Se ligar, tu pede pra ligar às 8, diz que aconteceu um problema e que eu não pude estar em casa pra atender, certo?
- Tá certo, Mirella.


às 7 e 30:

- BIA, ALGUÉM LIGOU?
- Nem...


às 8:
...


No outro dia:
nada.


Sexta, 10 da manhã:

- Alô, Mirella? Te acordei?
- (mentindo) Não, tava lendo...
- É que eu perdi a minha agenda, mas olha, vamos combinar de você vir aqui?
- Vamos.
- Que dia você pode vir?
- Que dia você pode me receber?
- Só semana que vem. Terça pode ser?
- Depois das 2, antes das 12.
- Pois terça depois das 2.
- Certo.


Terça às 11:

- Alou, Denis? É a Mirella.
- Oi Mirella...
- To ligando pra confirmar o horário...
- ô mirella.. tu vai me desculpar, mas é que essa semana não vai dar, tá muito corrido aqui na agência...
- Ah... tudo bem...
- Mas essa semana ainda vai folgar.
- (?)
- Quando você vier aqui você vai ver como é o ambiente de uma agência...
- (??) é? ... Mas eu.. eu sei como é...
- Pois então essa semana ainda eu te ligo. Amanhã ou depois, já deve estar mais calmo e eu te ligo.
- Tá certo.


Amanha:
...

Depois:
...

Sexta:
...


Segunda (11hs):

- Alô!
- Alou. Eu gostaria de falar com o Denis?!
- Quem gostaria?
- é Mirella.
- MIRELLA?
- olha ele não tá podendo atender agora. É a respeito de trabalho?
- É sim, mas tudo bem, ligo outra hora.

sexta-feira, outubro 17, 2003

Você conhece mesmo a Mirella?
Fomentemos pois a revolta.
A revolta contra os versos não escritos, as palavras não ditas, os livros
não publicados. Contra as canções que se perderam nos formigueiros mentais
daqueles que não tiveram o ímpeto de dedicá-las a quem deveriam ser
dedicadas.
E, por que não, contra estes, que sonharam versos, livros e canções, criaram
mundos e semearam o bom sentimento, mas não se propuseram a seguir em
frente, e dar o passo mais importante,
mudar o vazio de suas vidas petrificadas.



Eu sou esta pessoa. A que não fez nada.

quarta-feira, outubro 15, 2003

e ele, que sabe de tudo, até de mim mais que eu mesma, segundo ele, me disse que essa cor é verde alegria. e ainda me deu um carão quando eu respondi que pelo menos o verde não era que nem eu, sem felicidade.

segunda-feira, outubro 13, 2003

Ando pensando muito em duas pessoas também, Philipe Petit e Pierre Verger. De uma coisa de cada um. Aliás, de uma coisa que disseram de cada um. De Verger, alguém escreveu que em vez de se confinar em um quarto - por ter sido órfão, dentre outros problemas, sei lá, até porque nao vem ao caso - ele fez do mundo o seu próprio quarto. De Petit, quando ele negou ao seu tutor de corda bamba - eu que o nemeei assim - o uso de uma proteção, a resposta do outro foi, Eu entendo você. Você só quer fazer algo... bonito. E foi ínútil, gratuito e bonito, o que ele fez.

J'y suis jamais allé

"Eu já dei risada até a barriga doer, já nadei até perder o fôlego, já chorei até dormir e acordei com o rosto desfigurado. Já fiz cosquinha na minha irmã só pra ela parar de chorar, já me queimei brincando com vela. Eu já fiz bola de chiclete e melequei todo o rosto, já conversei com o espelho, e até já brinquei de ser bruxo. Já quis ser astronauta, violonista, mágico, caçador e trapezista. Já me escondi atrás da cortina e esqueci os pés para fora. Já passei trote por telefone, já tomei banho de chuva e acabei me viciando. Já roubei beijo, já fiz confissões antes de dormir em um quarto escuro para o meu melhor amigo. Já confundi sentimentos, peguei atalho errado e continuo andando pelo desconhecido. Já raspei o fundo da panela de arroz carreteiro, já me cortei fazendo a barba apressado, já chorei ouvindo música no ônibus. Já tentei esquecer algumas pessoas, mas descobri que essas são as mais dificeis de se esquecer. Já subi escondido no telhado pra tentar pegar estrelas, já subi em árvore pra roubar fruta, já caí da escada de bunda. Conheci a morte de perto, e agora anseio por viver cada dia. Já fiz juras eternas, já escrevi no muro da escola, já chorei sentado no chão do banheiro, já fugi de casa pra sempre, e voltei no outro instante. Já corri pra não deixar alguém chorando, já fiquei sozinho no meio de mil pessoas sentindo falta de uma só. Já vi pôr-do-sol cor-de-rosa e alaranjado, já me joguei na piscina sem vontade de voltar, já bebi uísque até sentir dormentes os meus lábios, já olhei a cidade de cima e mesmo assim não encontrei meu lugar. Já senti medo do escuro, já tremi de nervoso, já quase morri de amor, mas renasci novamente pra ver o sorriso de alguém especial. Já acordei no meio da noite e fiquei com medo de levantar. Já apostei em correr descalço na rua, já gritei de felicidade, já roubei rosas num enorme jardim. Já me apaixonei e achei que era para sempre, mas sempre era um "para sempre" pela metade. Já deitei na grama de madrugada e vi a Lua virar Sol, já chorei por ver amigos partindo, mas descobri que logo chegam novos, e a vida é mesmo um ir e vir sem razão. Foram tantas coisas feitas, momentos fotografados pelas lentes da emoção, guardados num baú, chamado coração. E agora um formulário me interroga, me encosta na parede e grita: "-Qual sua experiência?" Essa pergunta ecoa no meu cérebro: "- Experiência... experiência... Será que ser plantador de sorrisos é uma boa experiência? Não. Talvez eles não saibam ainda colher sonhos."

Recebi isso por e-mail. Tive a sensação que mais alguém sabe mais de mim que eu mesma. Sabedorias de internet a parte, é isso mesmo. É isso. Mas eu vou. Na terça eu vou lá, e sei que vão me perguntar, "e qual a sua experiência?" Que saco. Ando estranha demais, sem divertimento. Logo eu que me fazia feliz por nada, do nada, inventava as minhas diversões, tinha o meu mundo. Antes era assim, eu não tinha nada, tava feliz da vida, fazia um estardalhaço, testava as pessoas, para ver o quanto elas fariam por mim, pela minha infelicidade. Fazia questão de triplicar todas as dores, os anseios, as raivas, os medos. Hoje, que é tudo de verdade, ninguém sabe, ninguém vê, e se vêem, isso me enche de vergonha, de desconcerto. Ela dizia que ia ser assim. Ela sempre diz coisas certas, mas sempre bem antes da hora.

Ontem encontrei uma caixa. Minha vida dentro dessa caixa. A caixa eu recebi quando completei quinze anos. Vinha com um abajour, que hoje está lá no sítio e que a Mariana deixou cair. Depois a Bia colou. Foi pra lá porque era rosa e tudo aqui mudou, tem todas as cores agora, menos rosa. Recebi esse abajour de dois irmãos, Natasha e Pablo, moram no prédio do lado, ou moravam, já que não sei deles há muito tempo. Dentro da caixa, cartões, bilhetes, conversas de sala de aula, cartas de amor, cartas de amigos da mesma cidade, cartas de desconhecidos que colecionavam - ou colecionam? - fotos da Xuxa, cartas de 'amigas' de férias que nunca tornei a ver. Cartões que não me dizem mais nada, que não lembro do rosto do nome, Prisicilla, quem será você?, e cartão sincero "para uma das pessoas mais maravilhosas que já conheci" sem assinatura. Um postal da mãe, praça de Santelmo, na Argentina, e tango. Cartas que não enviei, muitas dessas. Pensei em enviar agora, totalmente fora de contexto, do nada, só porque não me pertencem, mas fiquei quieta. Num dos bilhetes combinávamos de estudar. Eu iria para a casa da Flávia e ela iria começar a estudar às duas. Lembrei da letra bonita dela, que tinhas dedos finos e longos e a palma da mão delicada e sem força nas linhas. Eu gastava horas olhando a mão dela. Ela me chamava de bestona. Tenho saudade. Dói essa saudade. Perplexa em perceber como algumas pessoas passaram anônimas. E não faz muito tempo essas coisas, não tem tanto tempo assim que tive dez, doze anos. Aluguei o filme. Vi de novo. E lembrei de quando encontrei no meio de outros papéis o telefone da Camila, fiquei sem saber o que fazer com este telefone o qual eu não ligaria mais. No filme o senhor que perdia o amigo apagava o telefone dele da caderneta. O telefone da Camila estava num papel solto e de caneta, eu não poderia me desfazer com tal respeito, teria de jogar mesmo fora. Não pude. E, sozinho, ele se perdeu. Essa minha memória é mesmo estranha.

quarta-feira, outubro 08, 2003

vontade de perguntar, mas é isso mesmo que você quer fazer a sua vida inteira?
todo dia ela sai correndo, depois do almoço, com a vida cheia, reclamando e feliz. ela enche a vida e eu sei por que. ela também sabe. sempre lembro da carol quando a vejo sair, do que ela me disse uma vez sobre uma outra menina que também corre demais. me dá uma dor no peito, vontade de dizer, ei, olha, tem mais coisa que isso lá fora, aí dentro, mas como eu ia explicar? carol talvez explique melhor que eu. mas o fato é que ela sai e eu acompanho com os olhos a saída esbaforida, suada, arregalada. ela sai feliz, nem sei porque, mas sai. e quando terminar a semana ela vai ter a sensação de algum dever cumprido, acho eu, e deve ser pra isso que corre, sei lá. talvez nao saiba tanto assim.

terça-feira, outubro 07, 2003

já estamos no mês da papuola amarela. e a menina nada.

quarta-feira, outubro 01, 2003

E nesses dias fazer o suco tem se tornado um ritual. Primeiro vai na estante e pega o espremedor de frutas, põe em cima da pia, perto da televisão, que está sempre desligada, liga-o na tomada mais de cima. Tem 3, uma, a de baixo, sempre está plugada a televisão, a outra, do meio, o ozonizador. Depois vai na geladeira, tira o saco das laranjas, leva-o à pia. Acomoda o saco no espaço que tem entre a cuba e a parede, embaixo da torneira, abre o saco e analisa laranja por laranja, a cor e a lisura da casca. Escolhe não as melhores, mas as mais simpáticas. Não tem erro, são sempre doces, apesar de a mãe dizer que essas sempre são as de casca mais lisa. Escolhe uma a uma e vai enfileirando, por ordem de chegada, do espremedor para o fim da pedra de granito. Sempre 4. Puxa o lixeirinho de pia, o mesmo desde que moravam sem a bia, desde que chegaram naquele edifício, para dentro da pia, entre as laranjas selecionadas e o saco com as outras laranjas. Vai na gaveta, pega a faca do cabo com a forma dos dedinhos, são as mais amoladas, e corta a primeira laranja. Examina o corte, retira as sementes, para que não congestione logo o aparelho, uma a uma, preferindo quando elas estão partidas ao meio, metade em uma banda da laranja, metade em outra banda, gosta de ver a separação delas, enquanto uma está no lixeiro, a outra está na fila, esperando que se esprema o todo o sumo da primeira banda, para que elas possam unir-se novamente. Sempre fica imaginando que elas sofrem a separação. E o processo vai se repetindo, e, a partir da segunda, o que lhe interessa mais é quando o bagaço que está na peneirinha enxarca e seca e cresce; enxarca e seca e crese; e soma mais suco dentro da jarra, aos pingos. E olha hipnotizada. Enquanto o suco vai ficando pronto, os nervos vão se acostumando com o espaço, com os olhares, com o desconforto, com as vozes, com os desejos. E só hoje entendeu por que faz suco toda noite.