Na sala lilás, entre janelas,
gelada, em pêlo, Chica sabe;
olho por olho, dente por dente,
para cada janela aberta
- gesto largo, arco e flecha -
dentro dela, no ato, outra janela se fecha.
interna, externa, não há saída nem brechas:
lado a lado, janela, janela.
Entre elas, enjoada, Chica divaga,
alheia, mergulhada na areia
de realidades reais, irreais, sobrenaturais.
Como se, sem navegar, navegasse
entre olhos, abrolhos e outras ondas,
rente às sonoras sobras de um só sonho.
- Que som risonho! - reconhece.
Janela, janela, dentro delas
sobem e descem infinitos anéis
dispostos em círculos, em espirais,
à frente, atrás, muito acima de tudo o mais.
Nos anéis, mil vagalhões,
mil vagas visões cênicas, oceânicas,
jogando Chica ora para fora,
ora para dentro da cova dos próprios leões.
Caindo com a manhã, há nos anéis
não o azul-marinho, velho, de Ticiano,
mas o mar vermelho, vinho de Tintoretto,
o luar caiado, tinto, do Omar Khayyam.
Ainda nos anéis, cenas banais, musicais,
Stálin, Mao, a quintessência dos cães,
do cosmos, do caos.
Na sala lilás, entre janelas,
gelada, em pêlo, Chica arde:
não há oceano, sequer cais -
dentro de uma sombra infinita, amarela,
numa janela outra janela, nada mais.
Sob a velada luz da cidade,
que é que tudo seduz, que é que a tudo invade?
Tarde após tarde, entre janelas,
somente Chica sonha, somente chica sabe.
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