quarta-feira, novembro 03, 2004

Ia falar sobre heróis. Príncipes encantados. Sobre os salvamentos que desencadeiam os romances - imaginários - da infância, ou pré-adolescência, que seja. Daqueles que a gente encontra na história da Bela Adormecida, da Branca de Neve, da Rapunzel. Ia falar sobre um filme brega de ação em que o cara perfeito aparece no momento certo em que a mocinha é baleada. E que é lindo, forte, charmoso, seguro, e sabe de tudo, medicina, mecânica, arte investigativa, marcial - porém não diz mistérios, marxismos, rímel, gás. E que ele age exatamente no justo tempo exigido pelo socorro, irrompe os portões da emergência com ela nos braços, já previamente imobilizada, e que tem a delicadeza de que, quando ela acordar, já lhe tenham sido enviado rosas e desejos de melhora, antes da visita, em que ela agradecerá, emocionada, o seu salvador. Ia falar de situações absurdas assim, que os americanos nos impuseram nos sonhos e nos medos. Mas não vou mais não. Os melhores filmes trazem os densos diálogos pausados dos franceses. E também porque um dia a mocinha do sonho americano acorda com a solidão, com a tristeza, com o desabamento deste seu mundo inventado - como se entrasse em órbita novamente. E porque sonhos como estes só se sustentam durante as duas horas da sessão de cinema.

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