quarta-feira, dezembro 08, 2004

Não pode ser tão difícil assim. Difícil não o caminho, caminhar é bom. Difícil é não ter dúvidas, recaídas e inseguranças. Acreditar piamente nas coisas, tudo de novo. Difícil e ter certeza de estar fazendo a coisa certa, e tão quanto, ou mais ainda, as coisas certo. Difícil mesmo é fazer coisas. Mesmo as boas. Mesmo quando em algum lugar um anjinho ou um diabinho diz é isso mesmo, vai, faz. Difícil sair dos dilemas que você se mete e que talvez nem precisasse, mas que ao mesmo tempo se pergunta que se ao achar precisar não já estivesse precisando. Difícil é entender a estratégia, achar o caminho livre do labirinto, desemaranhar a teia, frágil, dos acontecimentos. Difícil buscar alguma coisa dentro de si, porque é sempre a mesma coisa, e é sabido que ela nunca está lá, que talvez - e é bem mais provável que - ela nem exista. Difícil ser imóvel quando se pensa em asas o dia inteiro. Difícil. Como é difícil também carregar um sonho, o mesmo sonho, durante anos; suportar uma frustração, nova, inesperada e louca; manter a aparência, a juventude, a educação, o humor, a sanidade, a fé, a vontade, a labuta, a luta, o patriotismo, a casa, a gaveta fechada. É difícil ter coisas a dizer quando o mundo já está farto. De tudo. É difícil o calor, o envelhecimento, a dor nas costas, o buço que cresce, a carne que amolece, o pé que racha. É difícil achar que a cercania é pequena e estar dentro dela sem irromper porteiras. Mais ainda quando se sabe que os portões, os verdadeiros, são outros, de um aguçamento de intelecto que talvez nunca se alcance, mas sabendo da possibilidade (necessidade?) da sua existência. Redundante e difícil buscar um olhar que seja outro, pelo amor de deus, outro, porque estes há muito tempo não servem mais pra nada.

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